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Foto do escritorMônica Sanoli

A última casa da rua Needless é uma história que grita

The Last House on Needless Street foi publicado em março de 2021 e não demorou para aparecer nas TBRs e listas de recomendações da galera que eu acompanho. O nome, bem chamativo por si só, já me atraiu logo de cara, talvez pela proximidade de Needless com Needful (Things). Nada a ver, mas talvez meus companheiros constant readers me entendam. Fato é que, com a pulga devidamente instalada atrás da minha orelha, eu adicionei o livro à minha lista e não fiz questão de saber do que se tratava.


Capa do livro The Last House on Needless Street, com o título em vemelho sobre uma lua amarela e galhos secos e brancos nas bordas

Isso é algo que eu tenho o costume de fazer: tento chegar nos livros que me interessam sabendo o mínimo possível sobre eles. A leitura é quase sempre melhor assim. Acontece que, quando o terceiro livro da Catriona Ward ganhou sua versão brasileira pela tradução da Thereza Christina Rocque da Motta, A última casa da rua Needless deu uma leve bombada, e agora os brasileiros que eu acompanho também estavam falando – e muito bem! – do livro. Não tinha para onde fugir, e foi por isso – e também pela capa brasileira – que eu fiquei sabendo que um gato fazia parte da história.


Eu não tenho vergonha de admitir que sou uma leitora um pouco fresca, tem coisas que todo mundo adora que eu, de fato, não curto ler. E histórias que giram muito em torno de animais estão ali no top cinco. Então eu me lembro de pensar que o livro parecia não ter nada a ver com o que eu imaginava, e de ativamente deixá-lo de lado, no limbo da minha lista. Foi por isso que eu demorei tanto para lê-lo e só o fiz porque descobri que tenho Prime Reading e quis testar o serviço.


Capa do livro A última casa da rua Needless, uma casa em uma rua com iluminação esverdeada e um gato no canto esquerdo.

Através de uma escrita confiante e artifícios narrativos deliciosos e bem colocados, Catriona Ward nos apresenta a Ted, Olivia e Lauren, os habitantes da última casa da rua Needless. Ted é um cara com sérios problemas de memória e possivelmente transtornos de personalidade. Com um comportamento que beira o infantil, ele nos faz caminhar por cômodos sujos, comer coisas estranhas e acompanhá-lo em encontros falsos que ele marca em sites de relacionamento. Mas Ted também é um personagem que sofre, e que nos conta sobre sua dor da melhor maneira que pode. Eu passei o livro inteiro tentando não gostar dele e… pois é, falhei.


Olivia, por sua vez, é a fiel companheira do Ted, uma gata que ele resgatou recém-nascida e que narra, do seu jeitinho, como é cuidar dele e viver naquela casa. A maioria dos capítulos são divididos entre esses dois narradores, um menos confiável do que o outro, e aos poucos nós vamos usando as pistas que eles nos dão para solucionar um grande quebra-cabeças, um mistério que cresce à medida que a leitura avança. Como disse antes, não sou muito fã de animais que protagonizam livros, mas a Olivia me conquistou logo no seu primeiro capítulo, com o amor que ela sente pelo Ted, a gratidão que ela tem por ele tê-la salvado e o carinho com que ela descreve o cordão de luz que a liga ao coração do homem. Pelos olhos dela, nós vemos um Ted que é humano, cuja imagem não condiz com a que o resto do livro nos mostra.


A autora Catriona Ward, uma mulher loira, de cabelos lisos e compridos, vestindo uma blusa preta e um casaco verde escuro. Ela está sentada em um banco de madeira e olhando séria para a câmera.
Catriona Ward por Antonio Zazueta Olmos

Intercalando capítulos, Ted e Olivia falam sobre Lauren, a filha de Ted, que o visita aos finais de semana e de quem Olivia não gosta e evita ficar perto. Lauren ganha seus próprios capítulos mais para frente, quando quase tudo já deixou de fazer sentido, e sua narração deixa a história ainda mais confusa. A incoerência aparece desde o começo, com pequenas revelações ou comentários que os narradores fazem que não se sustentam quando comparados um ao outro. A própria descrição do interior da casa é diferente, dependendo de quem está narrando determinado capítulo, mas diferente de um jeito sutil, que pode até passar despercebido por leitores menos atentos. Esse é o grande trunfo da Catriona Ward em A última casa da rua Needless: instigar a nossa curiosidade com narradores improváveis e detalhes que se escondem por todo o livro.


Paralelo aos habitantes da casa, nós conhecemos uma garota chamada Dee, que perdeu sua família por conta de algo que aconteceu anos atrás. Quando Dee ainda era uma adolescente, seus pais levaram ela e a irmã mais nova para passar um dia no lago que, por sinal, fica além da floresta que começa depois da última casa da rua Needless. No meio do dia a garotinha desapareceu, e isso desestruturou completamente a família. Agora, já adulta, a Dee dedica sua vida a procurar pela irmã e pelo culpado do desaparecimento.


O enredo não passa tão longe da previsibilidade. A sensação de que tem algo muito errado na história desde o primeiro capítulo é tão forte, que leitores mais experientes cedo ou tarde conseguem adivinhar pelo menos uma parte da verdade. A execução, no entanto, é impecável e faz jus à urgência que o leitor – experiente ou não – sente ao ter este livro nas mãos. É uma história que grita para ser lida até o final o quanto antes, e que vai ficar na sua cabeça até você chegar à última palavra, possivelmente, até muito tempo depois.


Print de um tweet do Stephen King sobre a história que Catriona Ward escreveu para a antologia
"Embora não especificado, eu acho que a história da Catriona Ward na antologia sobre Dança da morte (The End of the World as We Know It) se passa na África do Sul. É uma ficção curta absolutamente incrível."

Como tantos outros livros de suspense, Needless Street leva uma recomendação assinada pelo Stephen King na capa. Se ele lê todos os livros que ganham blurb dele ou não, não somos nós que podemos dizer, mas eu aposto que ele leu esse, sim. E, falando em King, a Catriona Ward vai participar da antologia The End of the World as We Know It: Tales of Stephen King’s The Stand, uma coleção de contos assinados por vários autores de terror e suspense. As histórias vão explorar o que aconteceu no resto do mundo depois do vírus Captain Trips, de Dança da morte. O livro ainda não tem data de lançamento, mas conta com autores como Paul Tremblay e Tananarive Due; o primeiro, autor do livro que inspirou o filme Knock at the Cabin, dirigido pelo M. Night Shyamalan, a segunda, uma escritora de terror e especialista em horror negro que eu acredito que ainda não foi traduzida para o português (com exceção de um conto que aparece na coletânea Quem vai te ouvir gritar, organizada pelo Jordan Peele). A Catriona, no mínimo, anda em boa companhia.

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